A juíza Valdete Souto Severo, titular da 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre (RS), condenou uma rede de supermercados a pagar R$ 500 mil como reparação por danos sociais, além de R$ 50 mil como indenização por litigância de má-fé. Segundo a juíza, a empregadora descumpre de forma reiterada os direitos trabalhistas dos seus empregados, e utiliza-se da Justiça do Trabalho para obter vantagem econômica, o que caracteriza o chamado dumping social. A decisão é de primeira instância. Cabe recurso da sentença ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS).
A magistrada determinou o pagamento das indenizações no âmbito de uma ação individual, de um trabalhador que questionou a sua demissão por justa causa, ocorrida, segundo as alegações da empresa, devido a faltas injustificadas. Na sentença, a juíza determinou que a despedida seja convertida em dispensa sem justa causa e que todas as verbas atinentes a essa modalidade de ruptura do contrato sejam quitadas.
Quanto à litigância de má-fé, a magistrada apontou diversos aspectos que, segundo seu entendimento, comprovaram a conduta. Dentre eles, o fato de que a preposta enviada pela empresa para representá-la nada sabia a respeito das questões discutidas no processo, a apresentação de alegações sem fundamentos e sem ligação com os pedidos do trabalhador, e a exigência de que o empregado renunciasse à possível conversão da despedida por justa causa em despedida imotivada.
Segundo escreveu a juíza na sentença, a empregadora “buscou persuadir o autor a receber suas verbas resilitórias através de acordo com fraude e renúncia a direitos irrenunciáveis, utilizando-se da sua evidente necessidade (o reclamante declarou em audiência que ainda está desempregado)”.
Dano social
Já em relação ao dano social, a sentença apontou diversos fundamentos teóricos e aspectos da situação concreta analisada no processo. No entendimento da magistrada, os reiterados descumprimentos em relação aos direitos trabalhistas dos empregados é uma prática que fere a coletividade de trabalhadores. A juíza destacou que a empregadora responde a 277 processos apenas na 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, o que expõe a dimensão do número massivo de demandas apresentadas à Justiça do Trabalho.
Na avaliação da juíza, a conduta constitui dumping social, porque a empregadora adota a prática reiterada de despedir por justa causa, sem pagar verbas rescisórias, para conseguir negociar, durante o processo, o pagamento de um valor muito pequeno em relação ao que era devido inicialmente, o que acarreta em vantagem econômica diante de empresas de menor porte que cumprem a legislação trabalhista. A situação, conforme Valdete Severo, resulta em concorrência desleal e fere o próprio sistema capitalista.
Quanto ao caso concreto, a julgadora apontou que o trabalhador foi despedido inclusive sem a expedição de guias para o recebimento do seguro-desemprego, o que, em um contexto de pandemia e de crise econômica, como ressaltou a magistrada, poderia inviabilizar a própria sobrevivência do trabalhador.
Na sentença, ficou determinado que o montante relativo à indenização por dano social deve ser utilizado na quitação de processos da empregadora que foram arquivados com dívida e tramitam na 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, até o limite de R$ 20 mil em cada ação. Adicionalmente, o valor também poderá ser usado em ações propostas pelo Ministério Público do Trabalho, que visem diminuir os danos causados pela Covid-19 ou direcionadas ao combate do trabalho infantil no Rio Grande do Sul.
Já o valor referente à reparação por litigância de má-fé deverá ser revertido integralmente ao próprio trabalhador.
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